‘Não deixe o samba morrer, não deixe o samba acabar…’ *

Mesa de amigos no bar Cruzeiro (Foto: Laila Braghero)

Mesa de amigos no bar Cruzeiro (Foto: Laila Braghero)

Lá não entravam mulheres, fechava às 21h e servia cachaça e cigarro barato. Assim era o Cruzeiro até meados de 2006. “Iam fechar o bar, aí eu assumi, acabei com a bocha e coloquei música ao vivo.” César Augusto Pexe, 58, é a terceira geração de donos do singelo bar familiar da Moraes Barros, em Piracicaba. O mais antigo da cidade. Com 70 anos de tradição, o Cruzeiro teve o espaço construído em 1879, mas levava o nome de Bar do Chiquinho até 1919. Em seguida, transformou-se em Bar Almeida até 1938, quando recebeu o nome atual e a logomarca, que traz um cometa atravessando o mundo, o incurso inesperado e vindouro na calmaria da região.

Antigo ponto de encontro de inúmeros políticos e jogadores da seleção brasileira de futebol, o lugar hoje atrai artistas e reúne estudantes e amantes das artes, freguesia enlevada a partir do chorinho, MPB, jazz e o samba raiz. “Alguns músicos já são da casa, começaram esse trabalho junto com a gente, então eles tem a cara do bar. (…) Todo mundo que toca aqui vive de música e é profissional da música.” Pablo Delvagi, 29, é Programador Cultural do Cruzeiro. Formado em História, ele conta sobre a aproximação com o local através do grande interesse pela cultura brasileira, e fala com carinho de seu ambiente de trabalho, bem como o envolvimento com as linguagens artísticas. “O que a gente cobra na entrada é revertido, senão todo para o músico, para esse trabalho mensal de produção.”

César Augusto Pexe é a terceira geração de donos do estabelecimento (Foto: Ariane Precoma)

César Augusto Pexe é a terceira geração de donos do estabelecimento (Foto: Ariane Precoma)

São dois ambientes distintos que acolhem pessoas de todas as idades: na frente o tradicional boteco, mesinhas simples e balcão de granito, com direito a pote de azeitonas, saquinhos de torresmo à pururuca e muitos outros petiscos. Nos fundos, a “música”, assim chamado por Pexe o espaço para comer, beber e conversar, ouvindo agradáveis canções ao vivo. Ao longo dos anos, o Cruzeiro também é o responsável pela constituição de amizades verdadeiras e duradouras. É o que garantem os professores Lúcia Duarte, Mauri Casale, Joana Parise e Jadete Salum, o dentista Hélio Bertini e o empresário Manoel Fernandes (Nelo). Embora tenham se conhecido em outro bar, mantiveram o Cruzeiro como ponto de encontro para deixar os problemas de lado e colocar a conversa em dia.“Você começa a vir, aí você encontra gente que você se dá bem, e você começa a voltar, voltar e voltar com frequência”, comenta Lúcia.

No Cruzeiro a programação se desenrola de forma temática. Cada mês é escolhido um tema, e em cima dele os músicos são convidados a montar seu repertório. Maio será o mês dos compositores brasileiros, com homenagens a ilustres como Nelson Cavaquinho, Paulinho da Viola, Cartola, Ary Barroso, Luiz Gonzaga. “É uma forma de convidar outros gêneros que não esses que a gente mais trabalha, como o choro e o samba”, explica Delvagi ao expor sua preocupação em não deixar que a casa “caia em mesmice”. Outro atrativo incomum e perspicaz são as exposições que podem ser encontradas pelo ambiente. Cada mês, um artista plástico expõe suas obras, aperfeiçoando o ponto cultural da cidade, possuidor de uma clientela inteligente e divertida, de gosto exigente e frequência assídua. “(…) de 20 a 30 que vem todas as noites”, detalha o proprietário.

* Título, adaptação do trecho da música “Não deixe o samba morrer”. Composição de Edson Conceição/Aloísio.

Dica da casa: Aproveite as noites de Jazz do Cruzeiro, que acontecem uma vez por mês sempre às quintas-feiras. Solicite programação: (19) 3422-4780

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(*) Reportagem publicada no site laboratório Sou Repórter, do curso de Jornalismo da Unimep, para a disciplina Jornalismo na Internet I, em 17 de maio de 2011.

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